quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

descompasso

“Sei que as coisas têm o ritmo que elas têm, e não o que a gente consegue dar. É claro que me soltei, me deixei levar pelo que você dizia, pelas promessas escondidas que fazia, pelo silêncio que a gente compartilhava e pela voz de sono ao telefone.
Sei que eu poderia ter sido mais racional, como fui a vida inteira, mas acontece que, de verdade, eu não acreditava em nada do que tava acontecendo, não levava suas promessas a sério, e aproveitava os silêncios para criar minhas próprias melodias.
O fato é que apesar de tudo que a gente têm passado, eu continuo seguindo o meu ritmo diferente do ritmo que as coisas têm. E mesmo que você alegre os meus dias, isso tudo é sobre mim e não sobre você. Eu estou o tempo todo mergulhado no meu tempo.
Essa é a coisa mais egoísta que eu já te disse, mas são as coisas que você proporciona e não você própria, o que me faz cantar. Enquanto eu descubro as notas, estaremos felizes. Só não sei quanto tempo a música leva até ficar monótona.”

Já fazia algum tempo que ele tinha percebido isso. Então passou os últimos dias ensaiando o diálogo e, principalmente, escolhendo o ritmo certo das palavras. Ele adora subjetividade. Queria falar tudo, mas de um jeito que ela pudesse interpretar à sua maneira também.

Mas ela ouviu sem uma lágrima nos olhos. Continuou com a boca cerrada, sem tristeza ou surpresa, balançando a cabeça devagar. E na expressão dela, o que se via é que ela já sabia de tudo aquilo e, na verdade, olhava como que esperando pela conclusão do assunto.

Ele ficou desconcertado.
E mesmo assim nunca percebeu que ele era bossa nova e ela heavy metal.